top of page

miss estramboli_o assassinato diário do feminino de cada Ser

  • Foto do escritor: Apoena Serrat
    Apoena Serrat
  • 27 de mai. de 2020
  • 4 min de leitura

o processo de criação a partir do feminino_ da perspectiva feminista.



ree

Miss Estramboli é um olhar feminista sobre a criação da obra artística. Feminista porque acontece através do feminino com a cooperação do masculino. Feminista porque a dinâmica criativa da obra se dá através da manifestação do feminino, da sua sutil propositividade, com suas intercorrências, com suas desmedidas, com a sua abundância pro_criativa, com sua disrupção, onde acolhe-se o inesperado e procria-se a partir dele e com ele. Dialeticamente.


Esse exercício feminista de equidade na relação das forças criativas através da obra artística, nos projeta para as nossas dinâmicas sócio-afetivas colaborando na percepção de uma natureza criativa amoral, decolonizada, não-linear, imprevisível e potente, que precisa existir na consciência, através da consciência e para além da consciência.


Através de poéticas transversais, Miss Estramboli_o assassinato diário do feminino de cada Ser busca refletir e libertar a obra artística dos padrões patriarcais, colonizadores, machistas. Mas também dialogar com esses padrões e suas imagens constitutivas, na percepção e questionamento sobre como essas imagens estão impregnadas ao ponto de serem assimiladas como o próprio ser em si. A imagem da mulher é eixo primordial dessa reflexão. O feminino procriador é o condutor dessa jornada e também a divisa na compreensão da manifestação artística para além dos padrões estabelecidos pelos suportes e dispositivos artísticos.


É um projeto que investiga ao tempo em que decoloniza em procriação anarco-antropofágica propondo uma obra que nasce do cruzamento do cinema com a performance, áreas da minha atuação e pesquisa.


Historicamente foram atribuídas características ao feminino e ao masculino onde a sociedade não apenas construiu estereótipos de gênero como estabeleceu uma valoração superior às características do masculino em relação aos atribuídos do feminino. O caráter do masculino como ser ativo, rígido, ligado à razão, à lógica, de usar mais o amor condicional, de buscar o conflito, a agressividade, a destruição, o individualismo, a força, e a racionalidade são supervalorizados em detrimento à intuição, a não-racionalidade, o acolhimento, a não-linearidade, o cuidado, a empatia, a flexibilidade, a tolerância, a conexão ao sentimento, o amor incondicional, a capacidade de evitar o conflito, a disrupção e a capacidade de criar novas conexões e o potencial da procriatividade, características estas atribuídas ao feminino, que ainda tem a função protetora do mundo afetivo e é responsável pela nossa inteligência emocional, sistêmica e espiritual.


É preciso entendermos que a humanidade está constituída através da dinâmica do masculino e que a mulher, junto às demais minorias, faz um supra esforço para poder participar dessa sociedade, chegando ao ponto de assassinar subjetivamente a sua dimensão feminina para sua integração.


A macroconsciência masculina é ainda detentora dos controles de acesso ao sistema, seja através das instituições, seja através do lócus do trabalho, seja através da moralidade constitutiva, ou através do próprio Estado enquanto representação suprema.


A mulher ainda encontra-se em lugar de opressão, vulnerabilidade e marginalização junto à outras instâncias sociais, que de alguma forma manifestam suas identidades através do feminino.


Ao compreender que toda e qualquer identificação humana com o feminino coloca o indivíduo em vulnerabilidade, suscetível à violação, violência e extermínio, compreendi que somos impelidos à sistematicamente conter, violar e assassinar a dimensão do feminino que se manifesta em cada um de nós.


Invalidez e invisibilização são estratégias de dominação dessa necropolítica masculina abusiva, onde devemos identificar esse desequilíbrio entre as forças do feminino e do masculino tanto na macropolítica, quanto na nossa micropolítica. Não apenas a lógica do sistema da sociedade é masculino, como a lógica individual dos seres são afixadas em tentativa de adaptação e pertencimento à esse sistema, e decorrem dessa ubervalorização* das características atribuídas ao masculino.


É fundamental e urgente fazermos consciência quanto à esse desequilíbrio, a natureza da sua existência e suas estratégias de permanência, para podermos achar caminhos de intervenção à garantir uma equidade dessas forças, antes de tudo na esfera individual, para que esta tome corpo, na dimensão coletiva.


Miss Estramboli é uma obra que materializa as minhas inquietações decorrentes do pensamento crítico diante dessa sociedade machista, excludente, cis-hétero-patriarcal, capitalista e violenta, que legitima a sua fúria ao exterminar as diferenças. Na performance proponho a dinâmica de reequilíbrio através do processo criativo conduzido através do feminino, numa perspectiva feminista, ou seja, de equidade das forças e valoração das sua características.


A obra constrói um lugar de reflexão sistemática sobre as possibilidades de fala a partir do feminino, buscando contribuir com o pensamento feminista em três dimensões. A primeira através do compartilhamento da minha investigação sobre o universo do feminino, o seu recorrente assassinato e a criação a partir dele, disponibilizando a minha experiência de pesquisa e produção artística. A segunda dimensão é a introdução do feminino como valor na dimensão da consciência, principalmente através do lócus do trabalho. O trabalho realizado pela mulher pode e deve privilegiar o feminino, bem como o trabalho doméstico, realizado em sua maioria por mulheres invisibilizadas, deve-se atribuir real valor de importância. A terceira é o entendimento no sentido da compreensão de que o feminino pertence ao Ser, independente do gênero. Introduzir o homem dessa perspectiva é fundamental para a expansão do feminino na consciência e parte também da minha contribuição na perspectiva aqui pretendida.


O feminino é a dimensão em que vejo ser possível o encontro das instâncias socialmente marginalizadas e em estado de vulnerabilidade por questões sexistas, racistas, de gênero e de classe.


Com Miss Estramboli proponho uma leitura crítica que colabora numa perspectiva da interseccionalidade, numa compreensão de quanto mais nos aproximamos de uma manifestação de identidade dos povos ligada à natureza feminina, e nesse caso o paradigma afro-cêntrico e indigêna são os de maior expressão, maior a vulnerabilidade.

A partir desse diagnóstico, a obra desvela que onde há presença proeminentemente das expressões de identidade, individual ou coletiva, através do feminino, maior a ação violenta do sistema dominante de querer conter, violar e assassinar.


No entanto, o feminino está invadindo… A invasão, embora silenciosa, já começa a ser ouvida por muitos que optam por materializar toda natureza de simbolismos e signos, atribuídos inicialmente à mulher, como corporificação dessa entidade arquetípica.




*ubervalorização é uma palavra inventada para o texto, senti a necessidade de traduzir um estado de valor que vai além do valor em si, onde a coisa em questão, no caso o masculino, recebe um valor onde a superioridade em si é um status no próprio valor excepcional de ser.

Nas fotos estou em cena com a performance miss estramboli_o assassinato diário do feminino de cada Ser.


Foto de Lúcio Adeodato.



 
 
 

Comentários


  • White Instagram Icon
  • White Facebook Icon

© 2019 by Circo de Filmes.

Proudly created by Apoena Serrat.

oficina

InscriçÕes

Pra se inscrever é simples!

Basta preencher a ficha ao lado e enviar.

Confirmamos sua inscrição por e-mail. 

Thanks for submitting!

apoio financeiro:

apoio:

GI_Logo_horizontal_white_sRGB.PNG
REGUA_FundodeCultura-1.png
bottom of page